Como lidar com os desafios da vida
Estamos sendo desafiados a todo momento. A vida em si já é uma enorme batalha contra o meio. Temos que fazer um movimento enorme para nos mantermos vivos e cada pessoa reage de maneira diferente às adversidades ou desafios encontrados.
Nelson Mandela descreve bem o que representam os desafios na nossa vida: “A maior glória de viver não consiste em jamais cairmos, e sim reerguermos”.
Os desafios nos dão movimento na vida e nos trazem aprendizados e uma grande satisfação quando as conquistas chegam independentemente do tamanho delas. Toda Jornada nos faz atravessar inúmeros desafios. Neste artigo, quero trazer as minhas jornadas pelo Caminho de Santiago, os desafios físicos encontrados em cada uma delas e o que eu aprendi com eles.
Realizei o Caminho de Santiago em duas oportunidades: a primeira em 2014 quando o fiz de bicicleta, o que foi um divisor de águas na minha vida. A segunda foi a pé, já fazendo parte do meu projeto Caminhos Peregrinos no ano de 2017. Cada um me trouxe diferentes desafios. Pelo fato de estar em diferentes momentos de vida, encarei-os de maneiras distintas.
Quando damos de cara com um desafio improvável, o nosso cérebro é afetado imediatamente. E como dizem muitos neurocientistas: temos a amígdala sequestrada. Segundo essa teoria, agimos com a parte do cérebro que opera no modo instinto ou modo de sobrevivência.
Porém, há uma outra linha de pensamento que alguns neurocientistas corroboram, a qual diz que, mesmo em situações de risco, existem algumas conexões cerebrais, que estão ligadas à parte frontal do cérebro. Ou seja, temos alguma ação cognitiva. Nesse caso, entende-se que o cérebro faz apostas (uma espécie de acesso ao banco de dados). É um único comportamento engessado e padronizado.
Eu sempre digo que enfrentar desafios aumentam nosso repertório. Se eu “linkar” com a teoria das apostas do cérebro, percebo que, quanto mais repertório arraigado eu ou nós tenho/temos, mais podemos trabalhar com as emoções diante desses desafios. E não possuímos somente a identificação precoce e correta de certas emoções para promovermos a ação de mudança.
Dois exemplos da minha primeira passagem pelo Caminho de Santiago mostram muito bem isso. Logo no meu primeiro dia de jornada, saindo da cidade francesa de Saint Jean Pied de Port, era previsto, atravessando os Pirineus, entrar em território espanhol. Já tinha lido relatos que o tempo muda muito rapidamente por lá, mas não esperava que esse seria o meu “boas-vindas”.
Subir os Pirineus já é, por si só, um grande desafio e os 1.200 metros de diferença de altimetria era a barreira inicial. Não contava que, da metade em diante dessa etapa, o tempo virasse e me apresentasse uma tempestade digna de filmes de suspense. Era preciso continuar dentro de uma mata fechada com grande árvores, ventos fortes e uma descida de sete quilômetros de inclinação totalmente desfavorável para quem estava de bicicleta debaixo de chuva forte.
O normal seria o desespero, mas não foi isso que aconteceu. Mantive-me calmo e rapidamente pensei em todas as variáveis que tinha disponível naquele momento. Mudei algumas coisas e segui adiante, confiante que daria certo. Tenho absoluta certeza de que as emoções foram controladas devido ao repertório que tinha. Não era a primeira tempestade, não foi a única em local de risco com árvores e mata fechada, muito menos com descidas fortes com tudo molhado e bike pesada. O que variava era a distância que eu estava de casa se algo acontecesse ali. Dessa forma, pude resgatar decisões e alinhar conforme necessário.
Não corra de desafios! Busque novos e faça sempre algo que coloque sua cabeça para funcionar. Em algum determinado momento, você pode não ter repertório similar ao que você esteja vivendo, mas, certamente, seu cérebro terá mais condições de fazer escolhas mais condizentes com a sua realidade.
Encare desafios de frente! Respeite-os e trabalhe os aprendizados advindos deles seja nas conquistas ou nas derrotas e faça sempre um debriefing.
Num segundo momento, deparei-me com um desafio inusitado. No quinto dia de jornada, eu estava num vilarejo chamado Agés e me preparei para dormir. Em albergues peregrinos, existe um toque de recolher que acontece às 22 horas. Nesse momento, todos devem estar prontos para dormir. Eu dormi num quarto com outras nove pessoas.
Acordei assustado uma hora da manhã com muita dor e ardência no peito. Naquele momento, eu imaginei que pudesse estar tendo um infarto. A única coisa que veio à cabeça foi pensar na minha família no Brasil, já que eu ne encontrava num vilarejo sem recursos no interior da Espanha e longe de um grande centro.
Não podia fazer barulho. Naquele tempo, a comunicação era feito por SMS. Eu tinha celular conectado e a primeira coisa que fiz foi entrar em contato com meu cardiologista no Brasil. Foram 30 minutos muito angustiantes até receber a mensagem de volta. Ele me fez algumas perguntas e respondi uma a uma. Ele me tranquilizou dizendo que, muito certamente, não era um infarto e que seria, talvez, um desgaste grande devido ao esforço daqueles primeiros dias pedalando o dia inteiro.
Dessa história, entendi que, em qualquer situação, é essencial respirar fundo, a calma e pensar em quais opções estavam disponíveis naquele momento. Eu tive foi uma crise de pânico ao imaginar que pudesse estar infartando. Isso piorou todo o contexto, o que só foi amenizado diante da posição de um especialista.
Em meu repertório, tinha o número do meu médico. Eu me preparei fisicamente para esse desafio e, também, cuidei da minha saúde. Contatei médicos e fiz exames. Esse bom planejamento fez com que eu encontrasse uma alternativa que resolveu o meu problema. Daquele dia em diante, o caminho foi outro para mim e incorporei nas minhas ações o que era o real motivo de eu estar lá.
Muitos desafios estão relacionados com transições voluntárias. É nesse momento que se faz necessário um propósito bem definido. Sem propósito, perdemos o gás, desanimamos nas primeiras dificuldades e acabamos por não superar os desafios previstos e imprevistos. Geralmente, buscamos o nosso propósito quando vamos tomando maior ciência de nós mesmos. Vamos aprimorando nossa inteligência emocional, principalmente no que tange ao autoconhecimento.
Para enfrentar desafios, é fundamental que você se conheça. Desafios, cada um deles, vão fazendo-o(a) enxergar melhor você mesmo(a). E para cada desafio, é indispensável um bom plano.
Em 2017, eu parti para minha primeira peregrinação de fato. Percorrer os mesmos 830 quilômetros de Saint Jean até Santiago de Compostela; dessa vez, caminhando.
Em desafios dessa natureza, alguns riscos ou potenciais problemas são inerentes à circunstância: dores musculares, poucas horas de sono e um desgaste físico acumulado.
Um costumeiro desafio, que me trouxe um enorme aprendizado, foram as bolhas nos pés. Parece óbvio dizer que as bolhas seriam problemas, mas preciso confessar que mesmo o óbvio pode pregar peças de acordo com o modo como você se comporta diante da situação.
Sou corredor de ultramaratona, corredor de montanhas, acostumado com grandes distâncias e imaginei que não teria problema algum caminhando cerca de 30 a 40 quilômetros por dia. Pessoas me perguntam: “Qual bota usar para fazer o caminho?” E o que eu digo é: “Prudência é mais importante que o calçado”.
Respeite o desafio que está enfrentando ou que irá enfrentar. Confiança demais ou displicência faz com que você não avalie corretamente os riscos. Não escutar os limites do corpo também podem levar para o mesmo caminho do fiasco. Por muito pouco, bolhas, graves bolhas na planta do meu pé esquerdo, quase interromperam minha jornada e o projeto que estava desenvolvendo.
Primeiro erro que cometi foi: não respeitei o caminho, o caminhar com peso nas costas e o meu corpo. Ele me avisou do início do problema quando as bolhas começaram a aparecer. E o que eu fiz? Segui adiante, mais forte e confiante ainda, certo de que aquilo passaria e que não seria problema suficiente para me parar. Nem posso dizer que foi um ledo engano!
Um problema menor e não identificado ou mal resolvido pode trazer sérias consequências.
No meu caso, consegui seguir adiante, porém tive que colocar em prática duas formas de agir. A primeira foi a RESILIÊNCIA, pois, mesmo com a adversidade que encontrei, quase sem conseguir caminhar e ainda assim seguir adiante, foi fator fundamental para que eu concluísse o itinerário.
A outra foi a ADAPTABILIDADE. Tive que encontrar novas maneiras de caminhar e avaliar se teria riscos mais graves. A partir de então, mudei o modo de pisar e passei a exigir muito mais do meu caminhar. Meus calcanhares passariam a ser exigidos e, certamente, algum reflexo negativo ocorreria. Todavia, entendi que seria a melhor forma de continuar. Continuei e venci!
Resumindo, conhecer-se é primordial para quem quer enfrentar os desafios da vida. Só se conhece quem não foge dos desafios inesperados ou programados.
Foque no agora! Estar concentrado nas ações e no problema que você está enfrentando o(a) possibilita avaliar detalhes que podem fazer a diferença na superação.
Jogue para vencer! Se esse desafio está relacionado com o seu propósito, certamente, você será mais obstinado com a vitória. Entretanto, de qualquer forma, entrar no jogo para ganhar e mentalizar o sucesso fará grande diferença na sua maneira de agir.
Tenha um bom plano! Não há como enfrentar um desafio sem plano. É praticamente atestar derrota. Apesar dos instintos poderem ser grande coadjuvantes no processo, confiar somente neles, seguramente, aumentará o percentual de algo dar errado.
Espero que essas analogias e fundamentos o(a) faça encarar os desafios de outra maneira. Acredite e busque!